Por Vitória Benício
Os refugiados são trabalhadores assíduos, produtivos, criativos e carregam consigo sua cultura e têm orgulho disso. Eles chegam com um ideal para reconstruir suas vidas e acabam contribuindo culturalmente e economicamente para o país. O cientista político e professor do departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Maurício Santoro, explica que há um perfil relativamente comum entre os refugiados que costumam chegar até o Brasil. A maioria se mostra intelectual, artística, empreendedora e acadêmica.
Com o potencial de criar negócios, os refugiados conseguem montar suas próprias empresas. No Rio de Janeiro, por exemplo, é possível perceber um grande aumento de refugiados empreendedores no ramo culinário. Aqui é possível experimentar comida árabe ou africana, feita por sírios, congoleses ou nigerianos. Isso também ocorre em outros setores, como a música e a costura. Em termo de ganhos culturais, ao trazerem os estilos de outros países, a sociedade brasileira cada vez mais vem se renovando. “Abrir o Brasil para refugiados significa não só uma questão humanitária de ajudar pessoas que estão precisando, mas também trazer benefícios para o país, algo que é de interesse direto da própria comunidade”, diz Maurício.
Há sete meses morando no Rio de Janeiro, a refugiada J, 28 anos, veio de Bogotá, capital da Colômbia, e para esta reportagem preferiu não se identificar. Sem saber falar português, buscou ajuda no Programa de Atendimento a Refugiados e Solicitantes de Refúgio (PARES), da ONG Cáritas. Atualmente, ela e o marido trabalham na praia vendendo cordões e pulseiras. Porém, ambos estão na espera por um emprego fixo. “Eu sou empresária, tenho ensino superior e pós-graduação”, revela J. Além de já ter trabalhado na Colômbia como engenheira de sistemas, ela conta que possuía uma empresa de telecomunicações e tinha projetos de instalação de telefonia móvel. “Nosso contrato com uma empresa privada colombiana girava era em torno de 80 mil pesos (cerca de R$ 85 mil) e lá, empresários sofrem com extorsão”, explica ela.
Depois de vender o carro, o apartamento e móveis para pagar a extorsão, J. ficou sem dinheiro e seu marido passou a receber ameaças de morte. “Eu tinha que pagar o equivalente a R$ 5 mil reais, por semana”. Para fugir da milícia urbana, ela e sua família pegaram um barco pelo rio Amazonas, para não deixar rastros e conseguir chegar até o Brasil. “Foi difícil, eu fiquei preocupada com meus filhos pequenos, pois, podiam ficar doentes por conta do clima, da falta de higiene do barco e pela lotação, era muita gente dormindo amontoada. Foram oito dias de viagem”, conta. Desde que chegou ao Rio de Janeiro, J. procurou não entrar em contato com o restante da família na Colômbia, para que ela e o marido não fossem reconhecidos.
Apesar da dificuldade, a colombiana só quer encontrar estabilidade emocional, segurança e um bom lugar para reconstruir a vida. “Eu tenho vários projetos e espero conseguir montar um negócio. Sou empresária e líder, pode ser difícil, mas vamos seguir adiante”, diz ela.
Trabalhar na praia foi uma opção temporária para sustentar a família, o verdadeiro sonho de J. é abrir uma empresa. De início, pretende abrir uma barraca na praia para oferecer comida colombiana aos turistas, porém, mais adiante, quer ter seu próprio restaurante e assim manter contato com estrangeiros que falem espanhol. “É muito difícil trabalhar na praia. Eu tenho estudo e tinha outro tipo de trabalho. Mas eu prefiro ter minha família completa e segura do que viver uma tragédia”, afirma ela.
Devido à grande demanda de refugiados empreendedores, o PARES Cáritas, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), criou um grupo de costura e outro de gastronomia, para os refugiados trabalharem em eventos, feiras e criar seus próprios negócios. Esse projeto visa incentivá-los e elaborar um meio que possa compor a renda dessas famílias e ao mesmo tempo, realizar inúmeros sonhos.